Rock Borders: Hussein Salim é a mente por trás da saudosa banda Nosferatu, que foi criada na cidade de Campinas-SP e já está na ativa há mais de vinte anos. Primeiramente, meus parabéns pela garra, Hussein! Sabemos que você agora segue sozinho com a missão de levar o legado da banda adiante. Poderia nos dar alguns detalhes sobre o que ocasionou a partida dos demais integrantes que integravam atualmente a banda?
Hussein: Fala cara beleza? Primeiramente muito obrigado pelo espaço cedido.
Cara, é complicado, manter uma banda de heavy metal aqui no nosso país. O underground muitas vezes é confundido com coisa mal feita, com lixo e "tosqueira". Muitas vezes as pessoas fazem por amor, quando organizam eventos e tal, mas não tem o conhecimento, experiência. Temos muitas histórias de coisas absurdas que já aconteceram com a gente, e a lista é grande (risos).
Mas fica nesse lance de um dia você vai tocar e tem uma estrutura legal, na outra vez chega lá e a aparelhagem é uma merda.
Alguns integrantes já não estavam muito bem em situações familiares, profissionais e tal. Aí a pessoa vai ficando desgostosa com a situação, muitas vezes não estava acostumada a “se fuder” na estrada e aí foi preciso só mais algumas pequenas situações pra dar um empurrãozinho pra ela sair.
Pra ajudar estávamos com um ex-integrante quebrando galho no baixo pra gente ao vivo e ele não tava nem aí com nada, só ajudando a ferrar mais as coisas. O batera morava em outra cidade, aí gastava sempre com gasolina e pedágio pra vir pra cá ensaiar, tava sem trampo e terminando a faculdade, as coisas foram só complicando e ele acabou saindo. O outro guitarrista já não estava mais mostrando interesse, aí foi questão de tempo e falar que não ia rolar mais. E foi mais ou menos isso.
Rock Borders: Em 2003 saiu a primeira demo intitulada "Savoring the Blood" e logo em 2004 a banda disponibilizou o EP "Returning to the Slaughter". Você poderia nos falar como foi o processo de ensaios, composição e gravação desses trabalhos? E como foram recebidos pelo público na época?
Hussein: Bom, sobre o processo de ensaios e composição, a gente começou a ensaiar em 1999 quando nem sabíamos tocar nossos instrumentos direito (risos). A gente dava um jeito de ensaiar todo final de semana, era meio raro quando não rolava.
Então, fomos evoluindo bastante, sempre treinando nossos instrumentos e tirando muita música cover de diversas bandas que foram influência pra gente. Aí aos poucos as composições foram surgindo, "Full Moon Night" foi a primeira música que eu compus, só que ela era um pouco mais primitiva, depois a gente foi lapidando, acrescentando dobras de guitarra em algumas partes e etc., e conforme os integrantes fossem evoluindo também.
De resto, todas as músicas que entraram no "Returning to the Slaughter", já estavam compostas e a gente sempre tocava nos shows desde 2002. A idéia desde o começo era lançar isso como um CD prensado mesmo e em LP, mas isso tava muito longe da nossa realidade.
O valor da gravação ficou bem mais que o dobro do que havíamos previsto. Aí a gente pegou a intro, a "Night Walker" e a "Full Moon Night" que foram as músicas que o dono do estúdio liberou pra gente. Nossa alternativa foi lançar a demo-tape “Savoring the Blood”.
A gente prensou uma média de 130 cópias, era tudo feito meio artesanalmente (risos). Eu ia num lugar que vendia fitas K7 virgens, comprava umas 15 por vez, essas fitas eram gravadas uma por uma.
Aí as capas eu mandava imprimir em couchê.
Fomos vendendo essas fitas, mandando pra revistas, sites, zines etc., com isso fomos arrumando mais shows, a galera gostou bastante, a maioria das resenhas foram boas e um ano depois a gente conseguiu juntar o dinheiro pra pagar as músicas que faltavam no estúdio.
Em 2004 a gente lançou o "Returning To The Slaughter" pela primeira vez em CD-R, com impressão em cima do CD que a gente fazia em uma gráfica e as capas nós fazíamos da mesma forma artesanal em papel couchê (risos). Essas eu perdi as contas de quantas cópias foram lançadas, mas foram bastante.
Rock Borders: O EP "Returning to the Slaughter" teve alguns relançamentos, como foi o processo para disponibilizar novamente esse trabalho, e em quais formatos de mídia o trabalho foi relançado?
Hussein: Então, a idéia sempre foi lançar esse material de forma profissional, em 2006 a gente recebeu uma proposta pra lançar em LP, mas que não foi cumprida, depois de eu ficar muito no pé do cara, ele lançou isso em CD oficial em 2009 e iria lançar o LP (mas não lançou mais uma vez).
Aí sim o material saiu da forma que a gente gostaria, com encarte, fotos, letras e como já havia um tempo que ele foi lançado, saiu com biografia em inglês e português.
O CD vendeu bem, a galera gostou e quando nossas cópias acabaram, eu tentava entrar em contato com o cara da gravadora, pra eu comprar mais cópias e revender nos shows, mas ele simplesmente sumiu. Aí depois de um bom tempo sem ele sequer responder um e-mail, a gente relançou ele por outro selo, a Attitude Headbangers House em 2014.
Ele saiu também por uma gravadora da Malásia (Hellfire Records) com capa e encarte diferentes e em tape por uma gravadora da Bolívia (Morbillus Records). Além de estar disponível nas plataformas digitais (Spotify, Youtube etc.).
Está pra sair em LP também pela gravadora Classic Metal Records, dessa vez vai sair (risos).
Rock Borders: Em relação às apresentações e performances da Nosferatu, quais você destacaria? Vocês inclusive tocaram com a conceituada banda Dr. Sin, como foi a experiência?
Hussein: Uma apresentação que eu posso destacar foi a abertura do show da banda do Paul di’Anno, ex - vocalista do Iron Maiden.
A casa estava lotada, estávamos apreensivos, pois era uma grande responsabilidade e não sabíamos como seria a recepção do público, se iriam gostar ou querer que a gente saísse logo do palco para verem a apresentação da banda principal, mas foi muito melhor do que imaginávamos, a galera gostou bastante, todo mundo agitando e gritando o nome da banda, foi algo que não tem nem como explicar.
Quanto à abertura do show do Dr. Sin, foi algo um pouco conturbado. Haviam mais bandas de abertura que eram "amiguinhas" do organizador, eram bandas que faziam parte de uma "panela" que sempre tocavam lá quando tinha algum show importante. Nem era um público muito de acordo com o que a gente tocava.
Conclusão: as outras bandas tocaram uma hora, teve banda que tocou uma hora e meia, nós tínhamos meia-hora pra se apresentar. Subimos no palco, com o visual o mais carregado possível e tocamos as músicas muito mais rápidas por causa da adrenalina e pra dar tempo de tocar mais (risos). A galera ficava olhando meio que sem entender, aí batia palma, mas a gente tava no lugar errado e na hora errada (risos). Mas faz parte, teve gente que gostou e veio trocar
idéia (risos)
Nosferatu ao vivo |
Rock Borders: Como foi o contato com as bandas Tysondog (ING) e Thor (CAN) para a autorização das gravações dos covers para "Hammerhead" e "Lightning Strikes", e quais foram os requisitos para a escolha desses sons em específico?
Hussein: O contato foi através de e-mail. A gente tocava "Painted Heroes" do Tysondog bem no começo da banda, na época eu não tinha a letra e entrei em contato com eles, o baixista Kevin Wynn me respondeu, foi muito gente boa e me mandou ela por e-mail. Aí ficamos um tempo tocando ela.
Uns tempos depois começamos a tocar a "Hammerhead" e a "Lightning Strikes" do Thor. Quando fomos relançar o “Returning to the Slaughter” em CD oficial, decidimos colocar elas como faixas bônus. Eu Pedi autorização pro Kevin pra gravar e ele autorizou, aí entrei em contato com o John Mikl do Thor que nos autorizou a gravar a música também. Ao gravarmos esses covers, decidimos gravar elas o mais fiel possível das versões originais ao invés de fazer uma versão muito diferente.
Rock Borders: Para você, como foi lidar com tantas mudanças na formação? E você acha que isso teria afetado a sonoridade entre os primeiros trabalhos e o full-lenght "Satan's Child"?
Hussein: Foi bem desgastante, porque você perde muito tempo ensaiando com um novo integrante, deposita uma confiança nele e quando menos espera, ele acaba te deixando na mão pelos motivos mais bizarros possíveis na maioria das vezes (risos). Aí começa tudo de novo com um próximo integrante.
Quanto à sonoridade, acredito que cada um sempre trouxe alguma pegada diferente, então às vezes acabava acrescentando algo.
Quanto mais o tempo foi passando, a gente foi ficando mais exigente e precisávamos de músicos mais técnicos. As composições mais recentes foram ficando mais elaboradas.
Mas no geral ainda soa como a mesma banda, pois por mais que a gente tenha certa limitação em colocar coisas que fujam do estilo, eu sempre dei um jeito de colocar algumas influências bem diferentes, pra que a banda tente criar a sua própria identidade.
Rock Borders: Como é a relação da banda Nosferatu com selos e distros e o público em geral de fora do país?
Hussein: A relação é boa, existem algumas distros e selos ao redor do mundo que já nos ajudaram bastante. Mas a coisa ainda gira muito em "passos de tartaruga". O que atrapalha é sempre a questão do correio, pra mandar material pra fora e etc., no caso de trocas ou vendas. Ainda mais agora com essa questão do dólar e todas as burocracias que estão acontecendo.
Quanto ao público, é legal, porque às vezes aparece um pessoal entrando em contato de lugares que eu nem imaginava que o nosso material estava circulando. As vezes aparece gente com patch pintado a mão com o nosso logo e costurado no colete, patch de costas etc., Nessa hora eu vejo que todo o trabalho não foi em vão, porque tem gente compactuando com o nosso som e ideais em vários cantos do planeta. Isso me deixa muito contente com a sensação de missão cumprida (risos).
Rock Borders: Você poderia nos contar alguns detalhes sobre a participação da Nosferatu no tributo ao lendário grupo japonês Sabbat?
Hussein: O Daniel Danmented, vocal e guitarra da banda Axecuter estava querendo lançar um CD tributo ao Sabbat só com bandas brasileiras, aí ele nos convidou. Como a gente tocava a música "Bloody Countess" alguns anos atrás, nós só precisávamos relembrar ela e gravar. Mas fizemos mais pensando na versão do Metalucifer, que é um projeto dos próprios caras do Sabbat, só que de Heavy Metal Tradicional.
Então, combinava mais com a minha voz que é mais puxada pro limpo, apesar de que eu dei umas rasgadas meio Cronos (Venom) lá (risos). Gravamos tudo aqui no estúdio que eu tenho, mas quem mixou e masterizou foi o Arthur Migotto ex-vocal da banda Hazy Hamlet, que fez um excelente trabalho na minha opinião.
A idéia era deixar soar bem "datado" mesmo e acho que conseguimos (risos)
Rock Borders: Sobre a questão da pandemia, sabemos que a crise do Corona Vírus afetou todo o mundo, em especialmente o cenário musical, quais seriam suas considerações a respeito dessa catástrofe global?
Hussein: Sinceramente eu acho que isso ainda vai longe. O vírus está em mutação, cada hora surge uma variante nova.
O povo não se cuida direito e quando estiver perto de dar o prazo de liberarem os shows, a galera vai se descuidar, aí vai ter mais uma leva de pessoas infectadas e aí vem mais paralisações.
Tem muita coisa ($$$) envolvida no meio disso tudo. O país está polarizado e enquanto todo mundo fica brigando pra defender o seu político de estimação, a real atenção é tirada dando espaço pra que os grandes e poderosos controladores do mundo possam manter as pessoas com a mente nesse estado de latência.
Quando der uma boa erradicada, muita gente ainda vai ficar com medo e vai demorar até que as coisas voltem ao normal. O que o Corona Vírus não destruir, as próprias pessoas vão dar conta de o fazer, tornando o mundo um lugar cada vez mais caótico.
Rock Borders: Hussein, para finalizar, poderia nos contar quais outros lançamentos da banda você destacaria, e quando teremos mais um trabalho oficial da banda ao dispor?
Hussein: Eu posso destacar a nossa participação na coletânea Valhalla Demo Section Volume 2 da antiga revista Valhalla com a música “Metal Genocide”, participamos de uma coletânea em tape “Burning the cross” do zine "Crush the Cross", O Split LP com a banda Deathhammer da Noruega, o bootleg ao vivo “Total Holocaust live 2007” e a coletânea da Espanha “Spanish Steel Attack” com bandas do México, Espanha, Argentina, Chile e a gente do Brasil.
Eu estou preparando um "Lyric Video" com uma música que sairá em um single e talvez um vídeo clipe. Tem mais um single também em andamento e o "full-lenght" “Satan’s Child”.
Não sei dizer exatamente a data que cada material será lançado, pois eu sempre planejo de um jeito e acaba saindo de outro (risos). Vou depender dos selos que vão lançar esses materiais. Mas logo elas vão sair.
Rock Borders: Muito obrigado por seu tempo! Deixo o espaço para considerações finais.
Hussein: Muito obrigado, eu que agradeço pelo apoio cedido.
Quem quiser entrar em contato conosco e conhecer um pouco mais sobre a banda e conhecer o nosso som, é só nos procurar nas redes sociais, Nosferatu Heavy Metal (YouTube, Instagram, Facebook e Spotify).
Grande abraço aos leitores!
Valeu!